Reinventar a proteção dos trabalhadores num mundo pós-pandemia

Workforce Protection | 18 de maio de 2021

A COVID-19 acelerou as mudanças estruturais que já estavam a acontecer no local de trabalho. No reforço da proteção dos trabalhadores, está na altura de as empresas construírem uma ponte entre o “velho” e o “novo” mundo.

O início do surto de COVID-19 colocou desafios económicos numa escala como não se via há décadas. Com economias inteiras fechadas para conter o vírus, milhões de trabalhadores não voltaram aos seus empregos, alguns temporariamente, outros permanentemente. A COVID-19 expôs lacunas significativas nos sistemas de saúde pública e de proteção social de alguns países.

Mas, a pandemia também mostrou a rapidez com que os governos e os empregadores - seguradores incluídos -, podem agir na proteção dos trabalhadores. Políticas para abordar questões complexas - que anteriormente se supunha levarem anos, se não décadas, a conceber e implementar -, foram postas em prática em poucas semanas. Países como o Reino Unido e a Irlanda, sem histórico na oferta de apoio estatal na manutenção de empregos, foram capazes de introduzir pacotes de apoio de forma célere.

No entanto, estas respostas imediatas à crise são dispendiosas e de curto prazo. Há um consenso emergente de que são necessárias soluções de longo prazo para fomentar um ambiente no qual todos os trabalhadores possam alcançar o seu potencial, sabendo que, juntamente com as suas famílias, estarão protegidos e seguros, nos bons e nos maus momentos. 

 

Um novo contrato social que aprofunde a proteção dos trabalhadores

Definir um mundo de trabalho melhor: Argumentos para defender um novo contrato social” é o nome de um estudo do Grupo Zurich e da Universidade de Oxford, que inclui inquiridos de Portugal, e que propõe soluções sustentáveis com benefícios para os trabalhadores, empregadores e governos. Ao longo da investigação para este estudo, o Grupo Zurich tem vindo a recomendar uma ampla cooperação para apoiar os desgastados sistemas de segurança social de todo o mundo, mas agora a COVID-19 tornou premente a necessidade de defender um novo contrato social.

A pandemia acelerou as mudanças no papel do governo na provisão de seguros. Parece inevitável que o Estado já não possa ser o segurador de última instância, sobretudo devido ao aumento dos níveis de endividamento. Em simultâneo, uma força de trabalho mais sensível ao risco terá maior necessidade de proteção e mais apetência para se sentir protegida. O relatório defende novas parcerias entre governos, empregadores e fornecedores de benefícios, com vista a atenuar os riscos e aumentar a proteção dos  trabalhadores face aos riscos que a economia pós-pandemia acrescentará. Serão necessários programas robustos, que se reforcem reciprocamente, para proteger as fontes de rendimento das pessoas e famílias em risco, para a requalificação profissional e para a segurança financeira ao longo das carreiras profissionais e para além destas.

A COVID-19 causou um choque profundo no sistema económico global, acelerou drasticamente as mudanças no mundo do trabalho e revelou a necessidade de existirem investimentos significativos na educação, formação e sistemas de apoio social. Reforçou igualmente a necessidade de uma melhor proteção para quando as pessoas não podem continuar a trabalhar - normalmente as pessoas querem permanecer no trabalho o máximo de tempo possível porque, muitas das vezes precisam do apoio dos empregadores e do governo para lidar com a situação de ausência.

O elevado índice de desemprego provocado pela COVID-19 reavivou o interesse em esquemas de Rendimento Básico Universal (RBU), no entanto, as evidências que temos até agora não apoiam a sua eficácia. Na Zurich acreditamos que, embora o apoio aos esquemas do RBU permaneça elevado, a vontade política para implementá-los diminuirá após a crise da COVID-19.

Soluções de seguro relacionados com a saúde, invalidez, proteção dos rendimentos e de dependentes, tornariam possível que as pessoas dedicassem mais tempo a conseguirem uma melhor adequação entre as suas competências e os empregos disponíveis. Sem esta adequação de competências, as pessoas são forçadas a aceitar o primeiro emprego disponível, prejudicando assim o potencial do seu capital humano que poderiam oferecer numa função mais adequada ao seu perfil.

Estes seguros deveriam ser obrigatórios, porque as pessoas que correm maiores riscos são também as que deveriam ter as oportunidades para se adaptarem e ajustarem de forma a sustentarem o seu próprio bem-estar e, consequentemente, o bem-estar social. Ao mesmo tempo, é fundamental tornar mais fácil o ajuste das coberturas de seguros para que as pessoas encontrem os produtos mais adequados às suas necessidades que estão em permanente mudança.

 

Promover a literacia sobre a reforma

Apesar de continuar na ordem do dia, o aumento da idade da reforma implicará cada vez maiores riscos. Em muitos países, a idade oficial da reforma ainda ronda os 65 anos. Os especialistas recomendam, cada vez mais, elevar esta idade para, pelo menos, os 67 anos. A nossa investigação aponta para uma retirada faseada da força de trabalho para ajudar os trabalhadores mais velhos a gerir a transição demográfica e financeira para a reforma. Em vez de serem simplesmente prolongadas, as idades de reforma poderiam ser escalonadas, com uma retirada multianual e faseada da força de trabalho. Isto iria reequilibrar o papel das pensões: em vez de substituírem os rendimentos, iriam complementar os reduzidos rendimentos.

Isto leva-nos a um ponto base: a educação sobre a reforma deve começar mais cedo, como forma também de proteção dos trabalhadores. A nossa pesquisa mostra que os trabalhadores querem ter conhecimento e compreender as implicações das suas escolhas. O planeamento financeiro e a proteção são tópicos complexos e é necessário ajudar os trabalhadores no ativo a entenderem que opções têm disponíveis e qual o impacto das suas decisões. Frequentemente as pessoas sobrestimam o custo do seguro devido à complexidade dos produtos e, por isso, é preciso quebrar estas barreiras.

Há vontade e otimismo para que as pessoas possam usufruir dos benefícios da proteção social, mas falta passar da ambição à ação. Devemos agir em conjunto - empregadores, seguradores, governos e comunidades - para construir equidade no mundo do trabalho e assegurar que o futuro da proteção social será mais flexível e seguro para apoiar as pessoas ao longo da sua vida profissional, independentemente de onde e como escolham trabalhar.

O relatório principal “Definir um mundo de trabalho melhor: Argumentos para defender um novo contrato social” e os relatórios complementares “Definir um mundo de trabalho melhor: A perspetiva do empregador” e “Definir um mundo de trabalho melhor: O caso Europeu” foram elaborados através de informações recolhidas ao longo dos últimos cinco anos pelo Grupo Zurich e a Smith School of Enterprise and the Environment. As informações têm como base as respostas de cerca de 19 mil profissionais de 17 países – que inclui 1.100 portugueses com idades entre os 20 e 70 anos, empregados ou desempregados há menos de três meses -, 1.200 empresas, inquéritos de consumidores e entrevistas detalhadas com clientes empresariais da Zurich, realizadas durante a pandemia, sobre o futuro do trabalho.