Aquecimento global versus alterações climáticas: qual a diferença?

Sustentabilidade | Artigo | 08 de outubro de 2021

Para muitas pessoas, o aquecimento global parece benéfico. Urge, por isso, corrigir esta interpretação errada, de forma a garantir que estamos todos cientes da necessidade urgente de combater as alterações climáticas.

Em 2021, Glasgow foi aquecida por um verão glorioso. A cidade escocesa, que será a sede da COP26 - Conferência das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas, em novembro, desfrutou do terceiro julho mais quente de sempre, que foi também muito mais seco e ensolarado do que a média. Por esta razão, os habitantes de Glasgow podem acreditar, não intencionalmente, que estão a assistir aos benefícios do aquecimento global - e é precisamente aqui que reside o problema. Para muitas pessoas, principalmente as que vivem em climas mais frios, o aquecimento global parece benéfico. Como não apreciar invernos mais amenos e verões mais ensolarados?

Enquanto o termo “aquecimento global” parece ser parte do problema, a expressão “aumento constante da temperatura média do planeta” pode ser mais adequada. No entanto, os termos “aquecimento global” e “alterações climáticas” são frequentemente utilizados como sinónimos - essa interpretação incorreta é usada constantemente por negacionistas climáticos que preferem responder com uma pergunta: “Por que razão devemos agir se o que está a acontecer é termos, apenas, mais luz solar?”

Vamos começar do início. O aquecimento global e as alterações climáticas são acontecimentos diferentes, mas existe, entre eles, uma relação de causa e efeito. Ambos são prejudiciais para o planeta e para o nosso futuro. O recente relatório do Painel Intergovernamental sobre Alterações Climáticas (IPCC) confirma que ambos são predominantemente causados pelo comportamento humano, mas é certo que os processos naturais também contribuem – incluindo padrões cíclicos do oceano, como é o caso dos fenómenos climáticos do Pacífico, El Niño e La Niña – e até mesmo a forte atividade vulcânica para a realidade que vivemos. Porém, somos nós os maiores culpados pelo atual aceleramento das alterações climáticas e, por isso, cabe-nos a nós resolvê-las.

 

O que é o aquecimento global?

O aquecimento global diz respeito ao aumento da temperatura média global da superfície terrestre a longo prazo, que aumentou 1.2°C acima da linha de base pré-industrial. De acordo com o IPCC, pode atingir os 1.5°C já em meados da década de 2030. Um aumento de 1.2°C ou 1.5°C ao longo dos últimos 150 anos, ou mais, não parece ameaçador, mas é. E muito! Um pequeno aumento da temperatura global média do planeta pode produzir grandes efeitos. O IPCC relata que cada aumento de 0.5°C provoca “aumentos claramente discerníveis na intensidade e frequência de episódios de alta temperatura, incluindo ondas de calor e secas”.

Até mesmo a cidade de Glasgow, com as suas temperaturas de verão relativamente amenas, foi alertada sobre a escassez de água no final de julho, com pedidos para que as empresas e as pessoas preservassem os recursos hídricos. Temos também vindo a testemunhar ondas de calor em áreas consideradas de clima mais frio – consideremos, por exemplo, as temperaturas recordes que afetaram o oeste da América do Norte durante o verão de 2021. Várias cidades dos estados Oregon e Washington dos Estados Unidos e as províncias do oeste do Canadá registaram temperaturas muito acima dos 40°C.

A onda de calor chegou com um alerta adicional para Glasgow quando a vila de Lytton, na Colúmbia Britânica do Canadá, estabeleceu um novo recorde de temperatura canadense de 49.6°C. Lytton está situada a 50 graus de latitude em relação ao norte – apenas cinco graus ao sul de Glasgow. Se temperaturas extremas como estas atingirem o extremo norte, então Glasgow não pode presumir que ficará imune a ondas de calor semelhantes no futuro.

 

O que são as alterações climáticas?

As alterações climáticas englobam critérios mais amplos do que o aquecimento global. Digamos que são os efeitos colaterais do aquecimento global, em cascata, como é o caso das ondas de calor, secas e incêndios florestais. Outro exemplo: o aquecimento global vai derreter as calotas polares, o que aumentará os níveis do mar e ameaçará as comunidades costeiras. E ainda outro: um planeta mais quente vai também causar a diminuição dos glaciares nas montanhas, dos quais milhões de pessoas dependem para ter água potável e agricultura.

Definitivamente precisamos de compreender melhor as consequências do aquecimento do planeta, porque não se trata apenas de algumas regiões estarem a ficar um pouco mais quentes. É muito mais complexo do que isso. Há evidências de que o aquecimento global está a causar chuvas prolongadas, seca, geada ou calor. A maioria dos cientistas climáticos concorda que o aquecimento global vai agravar os fenómenos climáticos caóticos e severos. As tempestades tropicais vão tornar-se, provavelmente, mais impactantes, com velocidades de vento mais altas, maior extensão das aéreas afetadas, alterando os seus percursos mais comuns, dando lugar a novas tempestades tropicais que não conhecíamos ou, quando atingem a terra, a inundações provenientes de tempestades.

 

Adaptação a um mundo mais quente e imprevisível

Mas, Glasgow está a preparar-se para estes riscos. Em julho, enquanto os seus habitantes aproveitavam a luz do sol, foi lançada a Estratégia de Adaptação Climática e Plano de Ação para os próximos dez anos – o documento reconhece que Glasgow tem a possibilidade de sofrer com condições climáticas mais extremas e alerta, também, para chuvas de inverno mais fortes, diminuição das chuvas de verão, existência de mais ondas de calor, aumento do nível do mar e erosão costeira, para além da maior probabilidade de inundações – seja de rios, águas superficiais ou costeiras.

Isto representa um risco para o armazenamento de carbono no solo, para as plantações, para o gado e para a biodiversidade de água doce. A interrupção das cadeias de abastecimento e das redes de distribuição são outros motivos de preocupação.

De acordo com o relatório, todos estes riscos podem causar o aumento do desemprego e a ampliação das diferenças económicas e sociais. Mas - acrescenta o relatório -, se Glasgow fortalecer a sua resiliência climática, pode prosperar num novo clima e aproveitar novas oportunidades. Isso exigiria, por exemplo, preparar as casas e os escritórios para ondas de calor, proteger estradas e ligações ferroviárias contra inundações e plantar 20 milhões de árvores, de forma a resfriar a cidade durante altas temperaturas e a reduzir o risco de inundações.

As alterações climáticas vão impactar diferentes partes do mundo de formas diversas, mas ninguém vai ficar imune aos seus efeitos. Tal como Glasgow, todas as cidades, regiões e países precisam de desenvolver planos para se adaptarem e aumentarem a sua resiliência às alterações climáticas.

Mesmo se limitarmos o aumento de temperatura a 1.5°C, vamos continuar a sofrer os riscos físicos associados às alterações climáticas - o verão de 2021 foi uma prova disso. Devido às emissões acumuladas na atmosfera, podemos até assistir a um aumento na frequência e gravidade dos desastres naturais. E tudo isso antes de começarmos a considerar os riscos físicos de longo prazo, como o aumento dos níveis do mar.

 

Cenário do Armagedom

Há outro possível efeito colateral do aquecimento global, de longo prazo, que teria consequências graves para Glasgow: o colapso da Corrente do Golfo ou, como os especialistas chamam, a Circulação Meridional de Capotamento do Atlântico. De que se trata? É uma corrente marítima que conduz água quente e salgada do Golfo do México até à região nordeste do Atlântico. Afeta o clima, os ciclos sazonais e a temperatura na Escócia e noutras partes do oeste e do norte da Europa. Por exemplo, é por isso que, em janeiro, Glasgow tem uma temperatura média de +3°C, enquanto Moscovo – que está na mesma latitude – sofre com uma média de -7.9°C.

Contudo, o derretimento do gelo polar iria diluir a água salgada do mar no Atlântico Norte e, potencialmente, desativaria o “motor” que impulsiona a circulação do oceano. Pesquisas sugerem que a Corrente do Golfo está a perder estabilidade e no seu ponto mais fraco em 1.000 anos. Caso entre em colapso, teria um grande impacto no clima da Escócia e até faria com que a produção de colheitas diminuísse, incluindo a cevada, um dos principais cereais da Escócia e o principal ingrediente para a produção de whisky escocês. Paulatinamente, a população de Glasgow está a perceber que o aquecimento global é um fenómeno nefasto e que precisamos de enfrentar as alterações climáticas com urgência.

 

Tempo versus Clima: qual a diferença?

O tempo refere-se às condições atmosféricas que ocorrem localmente durante um período de tempo limitado – de horas a dias. Exemplos comuns incluem chuva, neve, granizo, ventos ou tempestades. O clima está relacionado com as condições atmosféricas médias num determinado local durante um longo período de tempo. Pode incluir padrões médios de temperatura, humidade e precipitação ao longo das estações, anos ou décadas.

Diminuir as emissões de carbono e outros gases com efeito de estufa é um dos grandes desafios de hoje em dia. Cabe-nos a nós limitar o aumento da temperatura média do planeta e travar o percurso das alterações climáticas – desta forma, estaremos todos a contribuir para uma sociedade mais próspera.