Missão a Medika

Sustentabilidade | Artigo | 15 de julho de 2022

A Susana Cortez não podia ficar impávida e serena a ver, através da televisão, o desenrolar da guerra na Ucrânia... e não o fez! Em vez disso, tomou medidas e conduziu por mais de 3.500 quilómetros até à fronteira entre a Polónia e a Ucrânia. Na bagagem levava donativos e a esperança de conseguir trazer consigo, em segurança, refugiados para Portugal.

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“Ver o horror do que estava a acontecer na Ucrânia mexeu com algumas das minhas emoções mais profundas”, diz Susana, que se juntou à Zurich em Portugal em 2001. “Já tinha doado comida e roupa, mas não era suficiente. Eu sentia que tinha de fazer mais!”

Para além de fazer parte da equipa de sinistros, a Susana envolve-se ativamente nas dinâmicas internas dos colaboradores da Zurich em Portugal – é vocalista na banda Incapazes de Tocar Afinados, faz parte do grupo de teatro e também abraça as iniciativas da Missão Azul, o clube de voluntariado. No meio de tudo isto, ainda encontra tempo para ajudar quem mais precisa. "Decidi que queria levar doações aos refugiados que diariamente via na televisão na fronteira entre a Polónia e a Ucrânia e que queria trazer pessoas que precisassem de ajuda", afirma Susana. "Eu sabia que ia ser difícil, mas a vontade de ajudar foi tão intensa que não podia ser ignorada."

Quando contou aos amigos o que iria fazer, eles quiseram envolver-se também. “Cinco dos meus amigos, vieram comigo e uma amiga ficou em Portugal a dar-nos algumas orientações de onde podíamos comer, dormir e por onde podíamos conduzir – ela era os nossos olhos e ouvidos na estrada!”.

Começaram a angariar fundos e bens para a viagem. “Promovemos a nossa missão nas redes sociais e pedimos ajuda a amigos, familiares, vizinhos e em escolas. Comida, roupa, medicamentos e dinheiro vieram da nossa comunidade local e também de pessoas que não conhecíamos de todo o país. Além disso, cada um de nós contribuiu com alguns fundos para esta viagem.”

Ao mesmo tempo, a Susana planeou o maior número possível de detalhes da viagem. “Definimos tudo: estradas, duração da viagem, os locais onde íamos dormir e comer, postos de abastecimento, locais onde podíamos alugar as carrinhas, os contactos das autoridades de cada país… e muito mais! Valeu a pena: ajudou a transformar aquilo que até ali era uma ideia em realidade.”

Uma semana antes da partida, a Susana informou a Zurich em Portugal. “No início, a pessoa a quem reporto pensou que eu tinha enlouquecido, mas não ficou surpreendida pois conhece-me bem”, recorda Susana entre gargalhadas. “Ele e a Zurich em Portugal foram incríveis – ajudaram-me a tornar tudo mais fácil e a seguir para esta viagem de forma mais protegida – com dias de voluntariado remunerados, melhorando o meu seguro de acidentes pessoais e fornecendo uma linha direta para o caso de vir a encontrar algum problema. Foram fantásticos!”

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A coragem de ir…

A 20 de março, Susana e os amigos partiram. “Foram 3.540 quilómetros de Lisboa até ao centro de refugiados em Medyka. Definimos pequenas pausas de três horas para dormir e estimámos que levaríamos cerca de três dias a chegar.”

“Os dias que antecederam a partida foram muito tensos, mas assim que partimos, a tensão desapareceu e foi substituída por um sentimento de alegria na esperança de que íamos conseguir trazer pessoas.”

O grupo chegou a Medyka como planeado a 23 de maio e dirigiu-se a dois centros de refugiados. “Os nossos donativos foram recebidos com gratidão e assim que as nossas carrinhas ficaram vazias procurámos pessoas que quisessem vir connosco para Portugal.”

No final, trouxeram nove mulheres, dois gatos e um cão. “Eu chorei muito quando vi que as pessoas tinham consigo os seus animais de estimação”, recorda Susana com lágrimas nos olhos. “Todas as mulheres que trouxemos tinham deixado entes queridos para trás e estavam emocionalmente afetadas. Uma delas teve de deixar os seus filhos de 17 e 18 anos na Ucrânia para lutar.”

A Susana percebeu que, embora as circunstâncias de cada uma daquelas mulheres fossem diferentes, todas tinham algo em comum: queriam deixar a Polónia e os centros de refugiados. Assim, só com algumas roupas e pequenas lembrança, como fotografias, vieram com a Susana e os amigos para Portugal.

O alívio depois da crença

“O regresso a casa foi difícil” conta Susana. “As mulheres estavam nervosas. Nenhuma tinha vindo a Portugal e não sabiam o que o futuro lhes reservava. Para as tranquilizar, reconfortámo-las, respondemos às perguntas delas e descrevemos a vida em Portugal. No final do dia, eramos estranhos, mas à medida que a viagem ia decorrendo, senti que começavam a confiar em nós.”

Três dias depois, atravessavam a fronteira para Portugal. “Foi um momento inacreditável!”, recorda Susana enquanto lhe surge um brilho nos olhos. “Parámos na beira da estrada e brindámos com champanhe. Estávamos tão aliviados, que todos chorámos.”

Contactaram a Câmara Municipal de Cascais e o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF). “Foram fantásticos. Apoiaram-nos com toda a burocracia legal e garantiram comida e alojamento gratuitos durante o primeiro mês num parque de campismo perto da costa, o que foi particularmente especial, uma vez que as mulheres nunca tinham visto o mar.”

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Quando a esperança se transforma em realidade

Hoje, as mulheres estão bem integradas. “No início, foi difícil, pois tiveram de ultrapassar muitas questões legais e de se adaptar à língua. Mas com o soberbo apoio da Câmara Municipal de Cascais e do SEF, está a tornar-se mais fácil.”

“Um mês depois de estarem em Portugal, o SEF conseguiu encontrar um lugar para cada um delas e atribuiu-lhes um local para ficarem” relata Susana. “Três trabalham e vivem numa quinta e duas fazem o mesmo noutra quinta. Duas trabalham na casa de uma médica e outras duas estão com familiares que já viviam em Portugal.”

“Mantemos o contacto” afirma Susana. “Visitamo-nos e falamos com regularidade através de um grupo de WhatsApp. É bom vê-las adaptarem-se à vida aqui. Estão muito gratas pelo apoio que receberam, mas, naturalmente, estão ansiosas por poder regressar à Ucrânia e recomeçar as suas vidas quando a guerra acabar.”

Questionada sobre se voltaria a fazê-lo, a Susana é categórica na resposta. “Sem dúvida! Ajudar as pessoas é um dos melhores sentimentos do mundo. E esta experiência ensinou-me que nada é impossível. Se acreditares e acreditares e acreditares, podes fazer qualquer coisa acontecer”.

Conheça mais detalhes desta história tão inspiradora, através da entrevista em que a Susana relata as decisões que tomou e os desafios que enfrentou nesta aventura.